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TEPT e a "rede do medo"

  • tepteviolenciaurba
  • 24 de fev. de 2015
  • 2 min de leitura

Diego morava em Copacabana. Tinha por hábito comprar pão toda manhã na padaria que ficava situada na esquina da rua do seu prédio. Numa manhã chuvosa de sábado, aconteceu algo inesperado: uma mulher ruiva que parecia estar sob efeito de drogas colocou uma arma em seu pescoço e ameaçou matá-lo caso ele não passasse a carteira. Seu amigo, que o acompanhava, deu à mulher sua carteira e o celular. Diego sentiu um frio na espinha. Seu coração quase saiu pela boca e ele lembra de começar a suar e tremer.

Diego sobreviveu ao assalto. Todo sábado de manhã, muitas pessoas continuam indo à mesma padaria e não são assaltadas. Diego, contudo, mudou-se para Curitiba na tentativa de parar de sentir aquele frio na espinha sempre que um pensamento sobre o trauma passava pela sua cabeça. Em vão. Todo sábado ele acorda sobressaltado. Se estiver chovendo, não sai da cama. Cortou completamente relações com o amigo. Parou de praticar atividade física, porque não suportava mais a sensação de suor que a atividade provocava. Mesmo evitando ao máximo qualquer estímulo que ele tenha vinculado ao trauma, a história se repete com a mesma intensidade, acompanhada das mesmas sensações físicas. O desespero era tanto que ele sentia como se tudo estivesse ocorrendo novamente. Para completar o quadro, Diego se culpava constantemente por não ter conseguido evitar que aquilo acontecesse. A raiva da assaltante é tanta que ele evita qualquer mulher com aquela cor de cabelo. "Mulheres ruivas não são confiáveis", "O Rio é extremamente perigoso" são pensamentos constantes. Ele se recusa a falar sobre o que aconteceu.

Diego tem TEPT. Os estímulos que estavam presentes no momento do trauma se encaixaram à ameaça de vida como peças de um quebra-cabeça e ficaram representados numa "rede do medo" em seu cérebro. Por isso, ele percebe ameaças em situações que não tem nada a ver com perigo. Ficam ligados a esse quebra-cabeça do medo três tipos de resposta: estímulos diretamente relacionados ao trauma (sábados, chuva, seu amigo, mulheres ruivas, Rio de Janeiro), sensações físicas que sentiu no momento do trauma (suor, tremor, frio na espinha, coração acelerado) e suas interpretações sobre o trauma ("Mulheres ruivas não são confiáveis", "O Rio é extremamente perigoso"). Como qualquer estímulo desses pode disparar aquelas reações desesperadoras, Diego os evita para se proteger, mas o alívio do medo é apenas temporário, porque, quando mais ele evita, mais ele generaliza o medo a longo prazo, tornando sua vida cada vez mais limitada. Agora, Curitiba não é mais seguro para Diego. Ele quer se mudar para o Canadá.

Diego pode voltar à sua vida antiga sem apresentar as sequelas do trauma? Se ele começar a falar sobre o que aconteceu de maneira orientada, com ajuda de profissionais especializados, a memória do trauma pode ser "digerida". Além disso, se ele enfrentar os estímulos que teme, mas que na realidade não representam perigo, cada um deles deixa de fazer parte do quebra-cabeça do medo. Não é fácil, mas existem profissionais prontos para ajudar pacientes com TEPT a processarem a memória traumática de maneira mais adaptativa. O assalto nunca vai deixar de ser um acontecimento triste para Diego, mas ele pode conseguir deixá-lo no passado e diminuir o impacto deste acontecimento em sua vida.


 
 
 

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